quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Segurança no trabalho - Riscos biológicos

Tribuna de Minas, 6.1.2010
Jacqueline Silva
Repórter

Categorias que exercem o ofício de curar enfermidades estão entre as mais expostas ao risco de adoecimento durante o exercício da profissão. Conforme dados do Protocolo de Atendimento ao Risco Biológico Ocupacional e Sexual (Parbos), que funciona no HPS, profissionais da área de saúde, como médicos, dentistas, enfermeiros e técnicos de enfermagem, sofrem, em média, quase dois acidentes/dia em Juiz de Fora e municípios do entorno. Desde dezembro de 2005, quando o serviço de referência foi criado pela Secretaria de Saúde local, 3.120 servidores das redes pública e privada precisaram passar por profilaxia específica para evitar infecções após terem se acidentado no trabalho. Geralmente as ocorrências envolvem material perfurocortantes e instrumental cirúrgico, como agulhas, seringas e lâminas de bisturi. A média é de 624 acidentes por ano, ou 52 por mês. No entanto, apesar de o acidente ocupacional na área de saúde ter notificação compulsória, a subnotificação é muito comum. Este tipo de acidente é considerado grave por expor a vítima a material biológico, infectante ou a microrganismos. A maior preocupação refere-se a contato com fluidos corporais - sangue, urina e saliva -, que podem transmitir doenças como HIV e hepatites B e C.

O ambiente hospitalar, de consultórios e de outras unidades favorece a ocorrência de eventos dessa natureza, devido a elevada frequência de procedimentos invasivos. "Quarenta por cento dos acidentes ocupacionais na saúde atendidos no Parbos em 2010 tiveram como vítimas técnicos e auxiliares de enfermagem", conta o infectologista do serviço, Guilherme Fernandes, acrescentando que as demais classes, como médicos e enfermeiros não atingem 5% cada. Segundo ele, essa prevalência se explica pelo fato de os técnicos e auxiliares atuarem diretamente nas funções de punção de veias, retirada de sangue e manipulação de materiais para exames.

Descuido e pressão
Conforme estudo desenvolvido na Universidade de São Paulo (USP) com 127 profissionais de um centro cirúrgico, a falta de atenção foi a principal causa dos 30 acidentes com material perfurocortante registrados em 2006, representando 36,7% do total de ocorrências. Em seguida apareceram: más condições de trabalho (20%), descuido de um colega (13,3%) e pressa (10%). Para Guilherme, as categorias ligadas à saúde não desenvolveram a cultura do autocuidado. "Na faculdade, o foco é sempre a atenção com o paciente, que deve ser a melhor possível. Já normas de biossegurança visando a proteção pessoal acabam ficando em segundo plano."

A diretora Administrativa do Departamento de Saúde do Trabalhador, Ivone Garcia da Silva, avalia que mais do que desatenção ou descuido, os acidentes ocupacionais na área de saúde estão ligados à pressão do tempo. "De modo geral, há um número reduzido de profissionais para atender a demanda da 'indústria da doença'. Os procedimentos médicos exigem agilidade e os patrões pressionam por produtividade. Esse conjunto de situações facilita o erro e o acidente."

Negligência transforma lixo em perigo
Entre os 3.120 profissionais atendidos no Protocolo de Atendimento ao Risco Biológico Ocupacional e Sexual (Parbos) desde 2005, 156 trabalham diretamente com lixo, seja na coleta domiciliar do Demlurb seja na segregação de resíduos em usinas. "Embora não estejam vinculados à área de saúde, estes profissionais são expostos a risco biológico ocupacional, porque costumam se ferir com agulhas e seringas depositadas de forma irregular no lixo residencial," afirma o infectologista Guilherme Cortes Fernandes.

Ele conta que doentes crônicos, como diabéticos, portadores de hepatite C e HIV, por exemplo, costumam usar medicação injetável. "Após o uso, os insumos, como agulhas, precisam de cuidado adequado. Não basta repor as capas de proteção das agulhas e dispensar em qualquer lugar. Este material deve ser armazenado em caixas de papelão ou vidros. Depois de juntar quantidade significativa, é preciso levar para a unidade de atenção primária à saúde (Uaps) mais próxima para que seja recolhido junto com o lixo hospitalar, que recebe tratamento diferenciado.

Dias de pânico
A diretora Administrativa do Departamento de Saúde do Trabalhador, Ivone Garcia da Silva, lembra dos dias de terror vividos por um pedreiro. "Ao sair do alojamento, após o trabalho, ele pisou em uma seringa, que estava junto com o lixo possivelmente espalhado por um cão. Temendo infecção, ele procurou o Parbos, onde recebeu a profilaxia de rotina. No entanto, a notícia de que poderia ter contraído Aids se espalhou, e os companheiros não permitiram que ele voltasse a ocupar o alojamento." Sem dinheiro e sem conhecidos na cidade, o pedreiro vagou pelas ruas por uns dias, pois não queria voltar à sua cidade, onde tinha mulher e filhos, com a doença, cujo diagnóstico não foi comprovado.

O homem conseguiu ajuda no sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil. Foi orientado sobre a eficiência dos medicamentos que recebeu para evitar um possível contágio e retornou para sua cidade com o compromisso de manter a ingestão dos remédios para barrar a infecção. "Nada disso teria acontecido se a pessoa que utilizou a seringa tivesse mais cuidado com o descarte. As pessoas agem assim por falta de orientação, não dimensionam o impacto que uma ação tão simples pode ter na vida de outra pessoa."

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