quarta-feira, 22 de junho de 2011

Os desafios do Saneamento Básico no Brasil - parte 1

Léo Heller[i] e Júlio César Teixeira[ii]
Observa-se hoje um claro descompasso entre o quadro sanitário exibido pelo Brasil e seu nível de desenvolvimento socioeconômico, ou ao menos aquele em que pretenderia se situar.
Analisando as várias estatísticas disponíveis, pode-se estimar que ainda mantemos cerca de 20% da população brasileira sem acesso a uma rede coletiva de abastecimento de água, população esta mais concentrada na área rural que na urbana. Trata-se de parcela populacional expressiva, de quase 40 milhões de pessoas, excluída do que a ONU decretou como um direito humano fundamental, “essencial para o pleno usufruto da vida e de outros direitos humanos”. E a ONU acrescenta que o direito humano refere-se ao acesso à água limpa e segura. A pergunta complementar que cabe aqui é: os 80% da população que as estatísticas apresentam como “atendidas” recebem água limpa e segura? Muitos sistemas de abastecimento não fornecem água potável e não a distribui com continuidade.
Por outro lado, cerca de um terço da população brasileira não tem uma disposição segura dos seus esgotos. E, muito grave, há um importante déficit no tratamento dos esgotos coletados. Historicamente, preocupou-se em afastar os esgotos das imediações dos domicílios, mas não de assegurar uma disposição ambiental adequada, resultando em expressiva poluição de nossas águas e disseminação dos riscos sanitários para regiões a jusante. Similarmente, quadro preocupante se verifica na disposição dos resíduos sólidos domiciliares, para o qual o IBGE estima que cerca de metade dos municípios os dispõe de forma inaceitável, gerando passivo sanitário e ambiental, que submete importante contingente populacional a riscos à sua vida e comprometimento de sua dignidade.
A drenagem das águas pluviais completa os componentes do saneamento básico, sendo desnecessário se estender demasiadamente para demonstrar a necessidade de intervenções nos fundos de vale urbanos, para a minimização das graves consequências das chuvas intensas. Estas atingem cidades crescentemente despreparadas para lidar com as chuvas.  
Evidentemente, ao se reportar o problema da exclusão sanitária no País, a preocupação não se limita ao acesso em si e com o desejo de uma evolução favorável das estatísticas, para o bem da nossa imagem. Na verdade, estamos nos referindo aos efeitos que a ausência de acesso provoca: os impactos na saúde humana, principalmente das crianças pobres; o comprometimento das condições ambientais; a indignidade da vida em ambiente com esgotos e lixo a céu aberto; a presença de ratos, baratas, moscas, mosquitos nas moradias e doenças infecciosas e parasitárias.


[i] Professor da Escola de Engenharia da UFMG
[ii] Professor da Faculdade de Engenharia da UFJF

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